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CONTRATOS DE GAVETA DE IMÓVEIS FINANCIADOS – MORTE DO SEGURADO (VENDEDOR)

Drª Kathia Kley Scheer – Advogada

Você compra um imóvel de terceiros, financiado, através de um contrato de gaveta. Continua pagando as prestações, o seguro e tudo vai bem. Até que a pessoa que lhe vendeu, morre.

A prática do denominado “contrato de gaveta”, é muito utilizada em negócios imobiliários e expressa a vontade das partes contratantes na transferência da titularidade dos direitos e obrigações sobre o imóvel em questão.

Muitas vezes as partes até realizam procuração pública, a fim de garantir a efetiva transferência dos direitos e obrigações relativas a essa venda. Tal procuração não tem caráter de mandato – representação – do vendedor, mas sim de conferir poderes de transferência do imóvel, de direitos e possui caráter irrevogável (que não pode ser cancelado).

O problema se dá quando o vendedor – aquele que fez o financiamento – morre e os herdeiros resolvem se apropriar, indevidamente, do imóvel vendido, uma vez que o agente financeiro quita o imóvel com o seguro que vem sendo pago juntamente com as prestações.

Mas e a tentativa dos herdeiros de burlarem essa venda e tentarem colocar no inventário o imóvel vendido pelo falecido?

Quando o contrato é bem feito, realizado através de profissionais competentes e é assinado, as partes contratantes decidem, de forma irretratável e irrevogável e com vinculação dos sucessores, a transferir ao comprador todos os direitos e obrigações subjacentes ao negócio oficial.

Há, portanto, uma sub-rogação de fato naqueles direitos e obrigações, oponíveis inclusive contra os sucessores do vendedor. Ou seja, todos os direitos e obrigações passam a ser do comprador!

Veja-se que, caso inexista seguro, o pagamento da dívida fiduciária, por força do contrato de promessa de compra e venda, seria do comprador e não dos sucessores, o que só reforça que cabe a ela se aproveitar da quitação do financiamento.

Desta forma, se a quitação operada com a morte do vendedor advém de seguro pago pelo comprador juntamente com as prestações, nada mais justo que o imóvel quitado lhe seja transferido sem condição ou ônus adicional.

“CIVIL. SFH. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. MORTE DO VENDEDOR. COBERTURA SECURITÁRIA.1. A morte do vendedor, subseqüentemente ao contrato de promessa de compra e venda, nada obstante verificada antes da transferência junto ao agente financeiro (credor hipotecário) e da formalidade do registro imobiliário, quita o respectivo contrato de financiamento em proveito do adquirente, como forma de impedir eventual enriquecimento sem causa e, também, em decorrência da sub-rogação de fato “nas obrigações de mútuo hipotecário”, com o pagamento das prestações e do prêmio do seguro neles embutido.2. Recurso especial conhecido, mas improvido.” (STJ, REsp 122032/RS – Relator Ministro FERNANDO GONÇALVES – QUARTA TURMA – Julgamento 27/05/2003 – DJ 01.08.2005 p. 461). (grifo meu)

E ainda:

“CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. ‘CONTRATO DE GAVETA’. MORTE DO PROMITENTE VENDEDOR COM A CONSEQÜENTE QUITAÇÃO DO SALDO DEVEDOR DO MÚTUO HIPOTECÁRIO. SUCESSORES QUE SE NEGAM A CUMPRIR O COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. Contrato de gaveta: designação atribuída aos negócios jurídicos de promessa de compra e venda de imóvel realizados sem o consentimento da instituição de crédito que financiou a aquisição; sobrevindo a morte do mutuário-promitente vendedor, os respectivos efeitos prevalecem sobre os do negócio oficial (mútuo hipotecário e seguro), sob pena de enriquecimento sem causa, porque a morte do mutuário/promitente vendedor só teve o efeito de quitar o saldo devedor do mútuo hipotecário, porque o prêmio de seguro foi pago pelo promitente comprador. Recurso especial conhecido, mas não provido.” (STJ, REsp 119466/MG – Relator Ministro ARI PARGENDLER – TERCEIRA TURMA – Julgamento 04/05/2000 – DJ 19.06.2000 p. 140 – JSTJ vol. 18 p. 221 -RJTAMG vol. 80 p. 457 – RSTJ vol. 134 p. 251).

Portanto, se você adquiriu um imóvel com financiamento, através de contrato de gaveta e os herdeiros do vendedor falecido estejam criando problemas para lhe outorgar a escritura do imóvel, fique atento, pois é seu direito obter essa escritura totalmente sem outros ônus.